Diários de Quarentena – Carta 6, Simone de Beauvoir

Foto: Youtube, Reprodução

Querida Simone,

Escrevo porque preciso dizer: está doendo te ler. E dói porque toca em vários pontos da minha vida, do meu “ser mulher”, que até aqui simplesmente abafei. Me recusei a sentir.

A verdade é que não quero ser apenas uma “carne frágil”, como em alguns momentos me senti na condição inevitável de existir neste mundo – e me vi reconhecida até nessa negação por meio das tuas palavras.

Afinal, até certo ponto, eu sou ela. Digo, esta carne escrava da biologia, da cultura, dos costumes. É inevitável. Sou existente. Minha identidade está fundida a tudo isso.

Mas sei, sinto que preciso – e quero – transcendê-la. Onde encontro a tua coragem? Imploro que me ajude. Ainda necessito de muitas, muitas, muitas respostas…

Porque também quero ajudar a todas as minhas irmãs. Só que, se não começar por mim mesma, como ajudarei? Como equilibrar essa força? 

De onde veio a tua? Quero dizer…a tua determinação para compreender que não é preciso ser perfeita para todos o tempo todo? A coragem de contestar, falar dos tabus, não temer as críticas?

A leveza para entender que é permitido errar? Eu, quando erro, quero morrer. E isso é tão limitante e injusto, certo? Imagino que acharia ridícula essa pressão que boto em mim mesma, porque ela não é minha, é do meio.

Talvez diria: “apenas continue lendo, escrevendo, filosofando…esse é o caminho para se tornar uma pessoa autêntica, sujeito da tua própria história e vida. Busque a independência, ganhe o teu próprio dinheiro, confie nas tuas escolhas”.

Quem sabe, afinal, essas já sejam algumas respostas.

Eu agradeço por isso, então.

Um abraço,

Rafaela

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