Ponciá Vicêncio, de Conceição Evaristo: dor transmutada em poesia (Resenha – Leituras Obrigatórias UFRGS 2024)

Em “Ponciá Vicêncio”, livro que integra a lista de leituras obrigatórias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 2024, Conceição Evaristo demonstra que, se é das sensibilidades simples que nascem as mais belas literaturas, não é por acaso seu lugar consagrado entre as maiores autoras deste país.

Nele, conhecemos a história de uma ex-escrava e seus encontros e desencontros consigo mesma e sua família. A obra escancara a dor – nunca redimida pela branquitude – do período da escravidão brasileira, mas com frases de pura poesia que fazem da narrativa de uma história brutal também um exercício de leitura delicada. Há poética apesar da brutalidade, afinal. Também, que se há de fazer diante do absurdo já ocorrido?

Ponciá é herdeira da escravidão e todas as suas violências físicas e psíquicas. Violências que internalizam marcas próprias, somadas àquelas da pobreza, perpetuando-as. Passeando pelo campo da Psicanálise – intencionalmente ou não – Conceição nos permite aqui contemplar em uma personagem os efeitos da profundidade de um trauma.

Vemos, em Ponciá, os efeitos traumáticos de vivências a partir de contextos históricos/culturais (escravidão, submissão) e pessoais (violência doméstica), sempre correlacionados. Nossa personagem, a partir destas agressões conjuntas, “se apaga de si mesma”, contempla vazios, permanece horas em silêncio.

Seu irmão, afastado do campo, na cidade sonha em ser soldado – fardado, forjando, assim, uma identidade que lhe garanta respeito. É ao tecer esta narrativa de tramas que Evaristo nos brinda com “frases-abraço”, como: 

“Com o zelo da arte (…) buscava significar as ausências e mutilações, que também conformam um corpo”;

“A vida era um tempo misturado do antes-agora-depois-e-do-depois-ainda”;

“O amanhã de Ponciá era feito de esquecimento”;

Em “Ponciá Vicêncio”, Conceição Evaristo demonstra que a vida é, de fato, como cantou Vinicius de Moraes, a arte do encontro. Muito embora haja tanto desencontro pela vida.

E tu? Já leste este livro? O que achou da obra? Aproveita para me contar aqui nos comentários. 🙂

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