Eu não costumava perceber. Eles simplesmente me escapavam. Falo daqueles pequenos intervalos da vida. A transição entre a alegria e a dor. O preenchimento e o vazio. Som e silêncio. Inspiração e expiração.
É que tudo pode simplesmente se misturar tão rápido. Até que fica veloz demais e você simplesmente se perde. De si mesmo(a), dos encontros, das belezas.
Agora, isolada, percebo mais claramente.
Um pôr do sol que não foi contemplado jamais retorna. Tenho observado a forma como ele se vai, em um estalar de dedos, de um instante para outro. O espetáculo é sempre singular, não se repete de forma igual em nenhum dia – ainda que o de hoje se pareça com o de ontem.
Tudo é sempre mutação. É por isso que tenho procurado captar os instantes. Quando estamos entre quatro paredes eles se tornam mais visíveis e preciosos.
A pausa no trabalho para ouvir uma música. Aquele tempinho de passar o café. Ler as páginas de um livro. Deixar o corpo inteiro no sol.
Efêmeros, preciosos lapsos de vida que antes não existiam. Ah, como é bom identificar as pausas. Voltei a percebê-las.
O Yoga aprofundou ainda mais minha compreensão de que há possibilidades para não sufocar, justamente no silêncio mental que atravessa o ato de inspirar e expirar. Esse pequeno, mas infinito instante que revela a essência de tudo.
Ali há um lugar de paz incomparável, em que nada do que é externo importa mais. Não existe a culpa pelo que fizemos ou deixamos de fazer; nem medo, ansiedade e insegurança.
Até mesmo a raiva dos opressores, as aversões e discordâncias desaparecem. Todas as ilusões da mente dualista se dissipam. Resta serenidade e tranquilidade.
Abrir espaço para o “prana” (a energia vital) circular livremente é a chance de encontrar um caminho para cessar, ainda que por um breve instante, o peso de viver em uma sociedade brasileira ainda marcada por injustiças, abusos, dores, desigualdades e, atualmente, genocídio de minorias. Quando a realidade pesa, a mente pesa.
E o único caminho de sanidade é respirar. A pausa da respiração é o verdadeiro elo entre corpo-mente.
“O que quer que aconteça na mente influencia a respiração; a respiração se torna mais rápida quando estamos agitados e mais profunda e calma quando relaxamos”, escreve T. K. V Desikachar em “O Coração do Yoga”, leitura que recomendo fortemente para quem busca se aprofundar mais nessa filosofia, como tenho feito.
Em outros termos, a respiração revela nosso estado de espírito. E, quando paramos para voluntariamente administrá-la, aí então podemos redirecionar a própria atividade da nossa mente. Centrá-la para dentro, para o que é quieto, sereno, pacífico.
De fato, repare: qual é a diferença entre um organismo vivo e outro morto? O ar que entra e sai dos pulmões. E tenho dito que é tempo de respirar. Profunda e calmamente. Em casa, de forma segura, se for possível para você. Não é hora de apressar a vida para que ela volte a correr.
No Brasil, a pandemia não acabou.
E uma vida sem pausas para respirar, antes e agora, continua sendo apenas uma forma de vida “zumbi”. Procure os espaços de clareza, de sentir o ar entrar e sair dos pulmões. Todas as respostas aparecem ali.
Sigo encontrando as minhas e espero, de coração, que você encontre as suas também.