Diários de Quarentena – Carta 1 , Lana Del Rey

Querida Lana,

Escrevo porque sinto necessidade de externalizar. Ontem contemplei o pôr do sol e comecei a pensar incessantemente, mais uma vez, sobre liberdade. Sei que, se há alguém no mundo que compreende meu anseio em encontrá-la…provavelmente é você.

Ser livre é tudo o que eu busco, meu desejo mais latente. Talvez não somente o meu, mas também o seu e o de todos nós, humanos.

É verdade que cheguei a buscar uma parte dessa utopia de liberação na estrada. E penso que você ficaria orgulhosa de ver o quanto me despi no decorrer do processo. Da minha própria cultura, dos meus preconceitos, medos e inseguranças.

Só que agora tal extensão da procura pela emancipação findou. Pelo menos por enquanto. A realidade é que agora não posso mais sair. Não é possível encontrar suspiros de consolo das amarras da sociedade no desconhecido da vida lá fora. Resta apenas eu aqui.

Isolada entre quatro paredes. E, por sorte e talvez algum mérito do que já conquistei como mulher, a tranquilidade da natureza ao meu redor para contemplar. Às vezes penso que a resposta é essa. Só o verde pode nos salvar da insanidade total.

Você já declarou que acredita “no país que a América costumava ser e na pessoa que você quer se tornar”. Tenho me apegado a isso por aqui também. Nunca antes enxerguei a realidade do meu país com tamanha clareza. O machismo, o racismo, a ignorância que me cercam. Há dias em que me sinto esfolada por tudo isso, não posso mentir.

Questiono de que servem meus ideais. Choro porque a dor do mundo e das pessoas me dói. Quase fisicamente. Mas tenho procurado formas de resistir.

Aliás, obrigada por ter escrito “Marina’s Apartment Complex”. Tenho pensado que talvez seja a música da minha vida. Ou, no mínimo, minha música dos últimos tempos, pelo menos em relação ao sentido que atribuí a ela.

 “Quem eu sou? Alguém que realmente acredita que as pessoas podem mudar”. E que, quando todos estão apenas falando, pode-se tomar uma posição. Quero ser esse tipo de pessoa. Quero acreditar no bem. Na luz e no amor. Alinhar discurso e prática.

Eu sei, sei que para mulheres ter esperança pode ser algo perigoso – você mesma alertou. Mas você diz que ainda a tem, de qualquer forma. Concordo. É preciso tê-la. Agir de acordo com nossos valores.

Às vezes me sinto como um ponto solto no ar vivendo com eles. Mas não os abandono. Porque a forma como vivemos é nosso maior ato político. Existir na vibração do amor em tempos de ódio já é uma forma de resistência, de luta pacífica, pautada pela serenidade e tecida por palavras doces.

Assim, retorno à ideia de liberdade. Ouso concluir que o que nos falta para encontrá-la é isso. Amor. Genuíno e desinteressado. Será que faz sentido?

Não sei. Mas, de qualquer forma, quero agradecer por sua música que, de alguma maneira, me faz sentir sã. Espero que você também siga inspirada pela arte. Quando nada mais fizer sentido, a poesia ainda pode nos salvar.

Um abraço,

Rafaela.




4 respostas para “Diários de Quarentena – Carta 1 , Lana Del Rey”

  1. Rafaela, não sei o que dizer já que estou inundada de tantos sentimentos. Me vi em você, nas suas palavras, em seus sentimentos, na sua necessidade da escrita para se esvaziar e na ânsia pela liberdade. Sinto exatamente tudo o que você falou e algo que também sempre proclamei, mas com outras palavras, me tocou desiadamente: “Às vezes me sinto como um ponto solto no ar vivendo com eles. Mas não os abandono. Porque a forma como vivemos é nosso maior ato político.”

    1. Renata, fico muito, muito, muito feliz de saber disso! <3
      É por isso que escrevo. Apesar de ser uma atividade solitária, quando minhas palavras tocam outras pessoas que se conectam a elas, também me sinto menos incompreendida neste mundo tão grande e complexo.
      Eu que agradeço pela gentileza de ter deixado seu feedback aqui.
      Obrigada e uma ótima semana para você.

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